sexta-feira, 30 de maio de 2008

Poema da face oculta


Poucos dos que me conhecem
Conhecem minha face por completo
Revelo-me aos poucos
A poucos
E só.

Talvez essa minha face oculta
Resulte de minha eterna desconfiança
Do outro
De mim
De todos.

Afinal qual a graça
De sermos lidos com tamanha facilidade?
No mistério de minha farsa é que reside
A essência do que sou de verdade.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Sarau


Escrevo um novo texto, rabisco, escrevo de novo. Construo e destruo. Leio e releio. Olho, de soslaio, resolvo, invoco, revolvo, enterro, detesto, amo. Penso e concluo: melhor prosa. Prosa flui, prosa amarra, prosa engendra. E o poema? Encanta, liberta, “ritmiza”, re-significa, alimenta. Gosto de ambos. Ambos tratam de língua, de signo, têm som, cor, cheiro, são cheios de eclipses, elipses, clips. E tudo cabe. Tudo entra. Tudo sabe. São multi. São muitos. São textos. Leio-os.
Trago-os.
O clima mais frio pede um aconchego de palavras bonitas e que brincam bonitamente com o sentido. Nada impede, porém, que um calor de trinta graus também seja inspiração. A luz se apaga e dá lugar à claridade das palavras bem amarradas. Grandes nomes são lembrados, versos populares celebrados. Bonito é ver a pedra do caminho re-significada pela nova entonação que se dá ali, no ambiente propício ao devaneio, ao novo entendimento, à nova compreensão das coisas. Novos olhares sobre o porquinho da índia, a princípio bobo, de início infantil, mas de sentido tão vasto quanto o mundo de seu Raimundo, de seu José e de sua valsa vienense – a qual ele ainda se recusa a tocar.
E o toque, o som, o som do toque no instrumento abre as portas pra canção, pra celebração, pro violão, pra percussão. E o novo enfoque são as notas agudas e graves que rompem as cordas do instrumento. Da voz.
“Notas musicais dentre bolas de sabão” – com as devidas aspas –, espalham-se e misturam-se ao cheiro aceso da parafina, da bebida que enleva, que refresca, que relaxa. Abrem-se as portas ao sorriso fácil, à piada, ao sarro. E o ar sério e compenetrado da declamação é transformado. E assim fica marcado mais um encontro. E assim celebra-se mais uma noite de sarau.